Top 10 adaptações literárias no cinema

Fala pessoal! Ainda ontem assisti a um filme que tava querendo ver há meses (desde que li o livro), e foi quando me veio a ideia de fazer esta lista. É uma lista bem pessoal, que inclui apenas títulos que eu pude tanto assistir quanto ler, e portanto tenho uma opinião melhor formada. Filmes que eu gostei muito, mas cujas obras originais ainda não conheci, estão excluídos. O critério de organização foi baseado na qualidade da produção em si, seus méritos cinematográficos, versus a fidelidade ao material-fonte. Ah! Também procurei pôr apenas um trabalho por autor, pra não ficar repetitivo. Qualquer discordâncias ou sugestões, quero ver nos comentários, beleza? Pois sem mais delongas! Vamos à lista:

====

10. O Guia do Mochileiro das Galáxias (The Hitchhiker's Guide to the Galaxy, 2005)
Direção: Garth Jennings
Baseado em: O Guia do Mochileiro das Galáxias, por Douglas Adams


Roteirizado e produzido pelo próprio criador, O Guia do Mochileiro das Galáxias é um filme (realmente extraordinário) que veio para selar a última adaptação de uma história que já cruzou todos os formatos de mídia. Baseado em parte no primeiro livro da série, segue depois por (mais) uma rota alternativa, que engloba a essência d'O Guia numa experiência audiovisual com menos de duas horas, transmitindo o legado de Douglas Adams para as gerações seguintes. Seguindo a linha de Monty Python, que O Guia ajudou a pavimentar como o intitulado "humor britânico", as aventuras espaciais de seus heróis seguem num ritmo crescente de nonsense que eclode em recompensas emocionais e intelectuais que apenas a genialidade cômica de Douglas Adams conseguiria proporcionar. O filme não agradou a todos os fãs, mas definitivamente marcou com muitos detalhes de sua apaixonada execução: visual, música, elenco ‒ o suficiente para dar novo fôlego a uma série de livros que, por assim dizer, fez escola. Infelizmente, o autor veio a falecer durante a produção, e o filme é dedicado "Para Douglas".

====

9. O Senhor dos Anéis (The Lord of the Rings, 2001-03)
Direção: Peter Jackson
Baseado em: O Senhor dos Anéis, por J.R.R. Tolkien



Dada a massiva extensão da obra original, a adaptação de Peter Jackson oculta diversos pontos da história e toma consideráveis liberdades criativas para facilitar a compreensão do público. Assim, apesar de inúmeras ressalvas quanto à fidelidade, a trilogia é um esforço adaptativo hercúleo, que triunfa com louvor em todos os aspectos técnicos concebíveis (como atestam seus diversos prêmios): fotografia, figurino, maquiagem, trilha sonora, efeitos visuais e elenco impecáveis. Contanto que resuma bastante o épico de Tolkien, a essência da história permanece, e emociona e conquista novos fãs até hoje ‒ sem deixar de agradar à maioria da fanbase clássica com sua riqueza de detalhes e easter eggs que, apesar de exigentes, apenas leitores aficionados conseguem captar. O Senhor dos Anéis não é a mais fiel das adaptações, mas é de longe uma das mais significativas conquistas cinematográficas do século.

====

8. Uma Grande Aventura (Watership Down, 1978)
Direção: Martin Rosen
Baseado em: A Longa Jornada, por Richard Adams



A versão de Martin Rosen é ligeiramente resumida, porém impactante e, às vezes, visceral. Enquanto o clássico britânico de Richard Adams se trata essencialmente de uma fantasia infantil, o filme conseguiu ser classificado apenas para maiores de 13 anos nos Estados Unidos. Apesar de tal barreira, retrata belamente as personagens e as sociedades dos coelhos descritas no livro, contando com sequências inteiras dedicadas à exposição da mitologia criada por Adams. A improvável riqueza da cultura existente na obra original é, portanto, transferida com sucesso para a tela, de forma que a experiência de assistir Watership Down é de completude, passando por diversas nuances emocionais. Um pouco obscuro para a geração atual, e no entanto uma lenda do cinema de animação, este é um filme que deve ser visto: um clássico que toca despretensiosamente uma miríade de temas sociais e literários, suscita diversos debates e consegue se manter atual quase quarenta anos depois. Recentemente, a Netflix anunciou um remake.

====

7. O Auto da Compadecida (nacional, 2000)
Direção: Guel Arraes
Baseado em: O Auto da Compadecida, por Ariano Suassuna




A clássica comédia de Ariano Suassuna inevitavelmente se tornou um dos grandes clássicos do nosso cinema, e não por menos. O filme cobre a peça em sua completude, e ainda consegue construir positivamente sobre ela, de modo que as inovações encantaram até o próprio autor, não muito chegado a alterações no roteiro. Equilibrando-se em doses ideais de drama e comédia, os marcantes personagens de Suassuna ganham vida na tela com uma caracterização e música inesquecíveis ‒ auxiliados por um elenco de estrelas brasileiras que ainda brilhariam no cinema e na tevê por vários anos. O Auto da Compadecida faz rir e até arranca lágrimas, diverte e emociona o público, a despeito de religião, no Nordeste e no Brasil inteiro: um filme que une o país e jamais deixa de ser comentado.

====

6. O Senhor das Moscas (Lord of the Flies, 1963)
Direção: Peter Brook
Baseado em: O Senhor das Moscas, por William Golding




Quando o Nobel de Literatura William Golding lançou O Senhor das Moscas, na década de 50, provavelmente a última coisa que ele tinha em mente era cunhar uma expressão; mas foi exatamente isso que aconteceu: o título se tornou instantaneamente associado a todo o caos social, temas sombrios e os lugares obscuros da psique humana, que a obra explora. O conto alegórico dos meninos que sobrevivem a um acidente de avião e são forçados a sobreviver em conjunto numa ilha deserta inspirou gerações de livros, filmes e séries ao longo das décadas. Apesar de passar despercebido pela geração atual, os temas de O Senhor das Moscas permeiam a cultura pop ainda em nossos dias: de Lost a Jogos Vorazes, de Quentin Tarantino a J.J. Abrams, por vezes sendo citado diretamente. Toda a crueza deste marco literário foi duplamente imortalizada nas telas em uma das adaptações cinematográficas mais aclamadas de todos os tempos, em 1963. Para quem não gosta de filmes em preto-e-branco, existe ainda uma segunda adaptação, de 1989, também fiel à essência do original, embora não tão impactante quanto o visceral take de Peter Brook.


====

5. Carrie, a Estranha (Carrie, 1976)
Direção: Brian DePalma
Baseado em: Carrie, por Stephen King



O romance que deslanchou a carreira de um dos autores mais consagrados da ficção contemporânea não teve que esperar muito tempo para chegar às telas pelas mãos de um dos mais consagrados cineastas de sua época. A adaptação original de Carrie é tudo o que o livro merecia: chocante, brutal, impecavelmente conduzida. Com performances dolorosamente verossímeis e cenas marcadas a fogo nos olhos dos expectadores, este era um filme destinado a se tornar um hit cult. Não à toa abriu as portas para incontáveis adaptações posteriores de trabalhos do escritor, e já foi refilmado duas vezes. Mas parece que nem o tempo, nem nenhum remake será capaz de ofuscar o brilho deste que foi a primeira voz a gritar o nome de Stephen King no cinema ‒ grito este que ecoa até os nossos dias.

====

4. Hamlet (Hamlet, 1996)
Direção: Kenneth Branagh
Baseado em: Hamlet, por William Shakespeare




O Bardo é prolífero, e seus diversos escritos já ganharam todas as artes e mídias da humanidade. No entanto, por alguma razão, tornou-se meio apagado no cinema nos últimos anos. Ainda assim, tem algumas citações que parecem ser conhecidas por toda alma vivente; duas delas são: "Há mais mistérios entre o céu e a terra do que sonha a nossa vã filosofia" e "Ser ou não ser? Eis a questão." A interessante relação entre essas duas linhas é que ambas são de Hamlet, largamente aclamada como a mais extraordinária obra de um autor que teve tudo. Não seria insano que alguém decidisse adaptar essa peça para o cinema, seguindo as páginas à risca, fala por fala? Pois foi isso que Kenneth Branagh (talvez vocês o conheçam como Gilderoy Lockhart) decidiu fazer em 1996. O resultado é inegavelmente fantástico, mas acaba se tornando meio cansativo. Os diálogos são extensos e, de fato, complexos, e algumas sequências ‒ especialmente no começo ‒ parecem se estender demais. Com suas quatro horas de projeção, Hamlet é um filme que precisa ser contemplado com paciência, mas que logra ser visual e emocionalmente extasiante: um feito que Shakespeare provavelmente aplaudiria de pé.

====

3. A Viagem (Cloud Atlas, 2012)
Direção: Irmãs Wachowskis, Tom Tykwer
Baseado em: Atlas de Nuvens, por David Mitchell




Tido como "infilmável" e "intraduzível", o clássico moderno do britânico David Mitchell rendeu-lhe inclusive uma comparação a Arthur C. Clarke. Após as Irmãs Wachowskis (Matrix) assumirem o roteiro junto a Tom Tykwer (Corra, Lola, Corra), o mais caro filme independente do mundo seria lançado em 2012. A história segue seis linhas interligadas através do tempo e do espaço, em seis épocas diferentes e locais distantes. Na película, nomes de peso interpretam mais de um personagem cada, exibindo um trabalho de maquiagem que causa inveja à CGI de blockbusters atuais. Os efeitos visuais são extraordinários, mudando o tom com incrível naturalidade entre um cenário e outro, enquanto eles se revezam com uma constância muito maior do que no romance. A música também é um ponto forte, que chegou a servir de referência nos trabalhos do autor americano Joe Hill. Naturalmente, o filme também deixa de fora e resume consideravelmente alguns pontos do livro, mas o produto final é tão conciso e poderoso para o cinema quanto o original é para a literatura, e a jornada emocional é uma experiência inesquecível ‒ pra quem não se lembra, dediquei a ela minha primeira entrada neste blog. Ah! Vale acrescentar que, após a barreira do "infilmável" ter sido derrubada, o livro "intraduzível" de 2004 até ganhou uma versão brasileira, em 2016.

====

2. Clube da Luta (Fight Club, 1999)
Direção: David Fincher
Baseado em: Clube da Luta, por Chuck Palahniuk




Chuck Palahniuk lançou seu hit mundial em 1996, e em 1999 ele ganhou as telas do cinema. Pouco há para ser dito sobre esta adaptação ‒ até porque eles não gostariam que falássemos ‒, mas vale mencionar que as mudanças no roteiro foram aplaudidas pelo autor, inclusive o desfecho, que Chuck disse ter sido melhor que o seu próprio. Não é algo que se ouve muito sobre adaptações, mas Clube da Luta é um filme impecável, que transfere com êxito toda a filosofia, dúvidas, questionamentos, emoções, reviravoltas, transgressão e diálogos marcantes do romance original para a linguagem cinematográfica. A versão inclusive conta com uma complexidade tal que precisa ser visto com atenção mais de uma vez para captar ‒ sabemos que você entendeu o filme da primeira vez, mas veja de novo. O livro mergulha nessas questões profundas com maior parcimônia, dando ao leitor o tempo de assimilar tudo sem perder a atmosfera excitante; o filme o faz de maneira mais sutil, mantendo o passo rápido e o expectador vidrado, o que é louvável. A dedicação dos realizadores a toda a concepção e execução desta empreitada é um claro exemplo do que difere as grandes obras do cinema dos milhares de filmes (inclusive adaptações literárias) medíocres e pretensiosos que populam Hollywood.

====

1. Watchmen (Watchmen, 2009)
Direção: Zack Snyder
Baseado em: Watchmen, por Alan Moore e Dave Gibbons




Assistir Watchmen é ler Watchmen. A versão do diretor é a experiência mais completa que você vai ter: três horas e meia que unem com maestria a narrativa chocante da obra original ao melhor da arte do entretenimento hollywoodiano. Provavelmente ainda o ponto mais alto da carreira de Zack Snyder, Watchmen traz às telas a íntegra da graphic novel mais aclamada de todos os tempos, com toda a violência e delicadeza que ela merece. Os slow motions que são marca registrada do diretor são muitíssimo bem utilizados aqui, e nem as sequências de sonhos e flashbacks são esquecidos. A única mudança notável no roteiro é um detalhe ‒ uma arma usada, para não dar spoiler ‒ no final, que sabemos que Alan Moore execra (inclusive nem teve seu nome vinculado ao filme, como de costume), mas que muitos fãs e críticos acharam ainda mais somativo. Fora isso, os diálogos, quadros e até recursos narrativos são traduzidos para o cinema com perfeição, e o Director's Cut conta até com uma sequência animada que adapta uma história paralela dentro da HQ. Watchmen é um feito extraordinário: brutal, provocante, hipnotizante e incrivelmente fiel. A prova definitiva de que a adaptação cinematográfica não precisa deturpar a história que pretende contar só porque "a linguagem é diferente": funciona com a mesma força em ambas as mídias. Seja você ou não um fã de histórias de super-heróis, este é um filme que deve ser visto.

====

Menções honrosas:

O Mercador de Veneza (The Merchant of Venice, 2004)
Direção: Michael Radford
Baseado em: O Mercador de Veneza, por William Shakespeare

Um Sonho de Liberdade (The Shawshank Redemption, 1994)
Direção: Frank Darabont
Baseado em: Rita Hayworth e a Redenção de Shawshank, por Stephen King

2001: Uma Odisseia no Espaço (2001: A Space Odyssey, 1968)
Direção: Stanley Kubrick
Baseado em: 2001: Uma Odisseia no Espaço, por Arthur C. Clarke (Na verdade o filme não é baseado no livro, já que o romance e o roteiro foram escritos em conjunto; razão pela qual o filme não figura na lista em si.)



You Might Also Like

0 comentários