A vida mal vivida

Quando Paulo Coelho​ e Raul Seixas​ trabalhavam juntos, compuseram uma música chamada Canto para a Minha Morte, que dizia o seguinte:

"Qual será a forma da minha morte? Uma das tantas coisas que eu não escolhi na vida. Existem tantas... um acidente de carro, o coração que se recusa a bater no próximo minuto, a anestesia mal aplicada, a vida mal vivida, a ferida mal curada, a dor já envelhecida, o câncer já espalhado e ainda escondido. Ou até — quem sabe? — um escorregão idiota num dia de sol... a cabeça no meio-fio..."

É interessante perceber aqui como "a vida mal vivida" é disposta casualmente em meio a tantas outras possíveis causas de morte igualmente fatais. Algumas acidentais, outras por mero descuido, e algumas simplesmente inevitáveis. Imprevisíveis. Em qual desses parâmetros entra "a vida mal vivida"?

É a única morte escolhida conscientemente. A morte em vida. Tão impiedosa quanto qualquer execução. Tão fatal quanto qualquer acidente. Tão destrutiva quanto qualquer doença mortal. Tão terrível, triste de se ver, quanto qualquer leucemia. Tão inexorável quanto qualquer imprevisibilidade da vida. A única diferença é que, esta, você escolhe sofrer.

Porém, assim como qualquer acidente, doença ou simples descuido, sempre há um momento em que, se percebido a tempo, pode-se voltar atrás. Pode-se salvar uma vida. Pode-se mudar, antes que seja tarde demais.

Fique feliz quanto a isso. Podia ser pior. Pense naqueles cuja sentença não é sequer uma questão de escolha.

Ironicamente, Raul não conseguiu antecipar a causa que lhe levaria da Terra cedo demais, mas que realmente o pegou no meio do copo de uísque. A pancreatite poderia ter sido qualquer outra coisa, qualquer outro mal ou eventualidade que atingisse o Maluco Beleza. Mas não esta. A vida mal vivida, não. Desta chaga ele passou longe, e fez questão.

E quanto a nós?

You Might Also Like

0 comentários